quinta-feira, 1 de setembro de 2011

CATEGORIAS BÁSICAS DA NARRATIVA


Segundo Benjamim Abdala Júnior o texto narrativo pode ser divido em várias categorias:
1- Foco Narrativo: Ponto ou Ângulo através do qual o narrador nos conta a história. Cada narrativa vai ter um foco narrativo dominante , que circunscreve e delimita os demais.
1.1- Foco dominante: Aparece no primeiro parágrafo
1.2- Tipos de focos narrativos:
a) Onisciência do autor: o narrador comporta-se como um deus: está em todos os lugares e em todas as épocas . Conhece o que esta dentro das personagens e o seu contesto histórico (3ª Pessoa)
b) Onisciência neutra: o narrador domina todo o universo ficcional, mas procura criar a ilusão de que não interfere na história. O narrador não faz comentários explícitos (3ª pessoa)
c) “Eu” como testemunha: foco de 1ª pessoa, onde o narrador é uma personagem de menor relevo e que relata fatos ocorridos com a personagem central.
d) “Eu” como protagonista: o narrador é o protagonista da ação; ele conta, em 1ª pessoa, fatos relacionados com ele mesmo.
e) Modo dramático: há o desaparecimento da figura do narrador; lemos o texto como se estivéssemos assistindo uma peça de teatro
2- Personagem

2.1- Personagens Simples e Complexas:
a) Personagens simples : comportamento previsível predicação direta.
b) Personagens complexas: comportamento imprevisível predicação indireta e ambígua
2.2- Personagens Planas e Redondas:
a) Personagens Planas: são as simples, estáticas não se transformam na narrativa. São os tipos .
b) Personagens Redondas: são as caracterização complexas, imprevisíveis e de predicação que vem aos poucos. Apresenta complexidade psicológica, pede focalização interna.

2.3- Funções das personagens:
a) Protagonista ou personagem sujeito: personagem central da narrativa, o sujeito da ação. Os conflitos desenvolvem-se em torno dela, que é o ponto de referencia para as alianças e confrontos entre as personagens.
b) Oponente: personagem secundário que coloca obstáculos à ação da personagem protagonista. Um caso particular de oponente é a antagonista: além de colocar obstáculos à concretização dos desejos e objetivos da protagonista, disputa o mesmo objetivo pretendido pela protagonista.
c) Adjuvante: Personagem secundário que auxilia a personagem protagonista, na busca de seu objetivo.

3- Espaço

3.1-Espaço referencial: o espaço real usado para a realidade do texto;
3.2-Espaço textual: palavras escritas que provocam no leitor o chamado “efeito do real”;
3.3-Representação do espaço:
a) Simultânea: espaço e ação ocorrem ao mesmo tempo (cinema).
b) Sucessiva : a construção do espaço interrompe a narrativa.

4- Tempo

4.1- Tempos externos à narrativa
a) Tempo do escritor: tempo histórico da vida do escritor que interfere na organização da sua narrativa pela presença dos valores da sua época e pela mudança desses valores ao curso de sua vida.
b) Tempo do leitor: a narrativa é lida também conforme os valores da época do leitor.
c) Tempo histórico: a história contada pelo narrador poderá se situar ou não na época do escritor.
4.2- Tempos internos da narrativa
a) O tempo da história:
a.1) Cronológico: sucessão cronológica de eventos explicitada pelo narrador ou deduzida pelo leitor;
a.2) Psicológico: é o templo cronológico distorcido em função das vivências subjetivas das personagens
b) Tempo do discurso: é a representação narrativa do tempo da história.

O AUTOR , SUA OBRA E SEU TEMPO.-FERNANDO SABINO

FERNANDO Tavares SABINO nasceu em Belo Horizonte, a 12 de outubro de 1923., filho de Domingos Sabino, procurador de partes e representante comercial, e sua mãe, Odette Tavares Sabino, t’pica doa de casa e mãe mineira. Fernando era o caçula e bastante mimado. Fez o jardim da infância no Delfim Moreira, o curso primário no Grupo Escolar Afonso Pena e o secundário no Ginásio Mineiro, em Belo Horizonte. Ingressou na faculdade de direito em 1941. terminando o curso em 1946 na Faculdade Federal do Rio de Janeiro. Em 1944, quando estava no terceiro ano de faculdade, mudou-se para o Rio de Janeiro e foi nomeado oficial do Registro de Interdições e Tutelas. Mas não levou a sério sua atividade de estudante de Direito. Nunca foi se quer buscar o diploma de bacharel.
Fernando era o protótipo do bom menino: escoteiro exemplar (dos 9 aos 13) ; campeão mineiro de natação nado de costas, por uns quatro anos; jovem escritor de contos desde os treze anos; e, eventualmente, o primeiro da classe. Às vezes, deixava transparecer em crônicas que não valeu a pena ser tão prendado. Aos 13 anos escreveu seu primeiro trabalho literário, uma história policial publicada na revista Argus, da polícia mineira. Passou a escrever crônicas sobre rádio, com que concorria a um concurso permanente da revista Carioca, do Rio: quando era premiado, recebia cinco mil reis. Uniu-se logo a Hélio Pellegrino, Otto Lara Resende e Paulo Mendes Campos, moravam em Belo horizonte e são amigos de Fernando desde o tempo de escoteiros até hoje. Em Belo Horizonte, os quatro moravam próximos uns dos outros: Fernando, na praça da Liberdade; Hélio, na rua Bernardo Guimarães; Paulo, na avenida Paraúna, que hoje se chama Getúlio Vargas, e Otto na rua Alagoas. Andavam o tempo todo. Podia-se fazer o percurso desses quatro endereços a pé, no máximo num quarto de hora. , Ainda na adolescência publicou seu primeiro livro, "Os Grilos Não Cantam Mais" (1941), composto de contos a que hoje não dá importância – sem motivo, pois eram muito bons para a idade e já delineavam o escritor que viria a ser. Enviou um exemplar a Mario de Andrade.e ele escreveu-lhe uma carta elogiosa, dando início à fecunda correspondência entre ambos. Anos mais tarde, publicaria as cartas do escritor paulista em livro, sob o título "Cartas a um Jovem Escritor" (1982). Em 1944 publica a novela "A Marca" e muda-se para o Rio.
Em 1946 vai para Nova York viajando no mesmo avião com Vinícius de Moraes. Foi para os Estados Unidos ser auxiliar do escritório comercial do Brasil em Nova York. De.sua estada lá, destaca algumas coisas importantes, tais como: aperfeiçoar o inglês, tomar conhecimento mais intimo com a obra de escritores de língua inglesa, ouvir jazz, aprofundar e aproveitar ao máximo a convivência com o compositor Jayme Ovalle, que lá vivia. Num sensível artigo “Suíte Ovalliana” (de Gente), Fernando Sabino presta testemunho de grandeza de alma de Ovalle, Neste período escreveu crônicas semanais sobre a vida americana que enviava regularmente para jornais brasileiros, muitas delas incluídas em seu livro "A Cidade Vazia" (1950). Em 1947 escreveu as novelas que compõe “A Vida Real” (publicado em 1952), texto muito voltados para uma preocupação de ordem literária, com muita especulação e muita perquirição. Resolveu escrever para fazer uma higiene Mental de pura brincadeira, sem a menor intenção de publicar e sem menor compromisso com a literatura, um livro que não teria fim. Escreveu umas sessenta páginas e parou. Às vezes, pensava em retomar, mas não ia para frente Anos mais tarde, Fernando mostrou o que já havia escrito à “mui nobre, distinta e formosa senhora dos seus afetos, dona Lygia Marina de Sá Leitão Pires de Moraes, de cujos seu coração é cativo” e a quem o livro acabou sendo dedicado. Ela adorou o trabalho e o entusiasmou a prosseguir. Incentivado, reescreveu o livro todo em dezoito dias. Sucesso de público e de crítica, “O Grande Mentecapto” acabou recebendo, em outubro de 1980, o Prêmio Jabuti. Em 1989 o livro serviria de argumento para um filme de igual sucesso, dirigido por Oswaldo Caldeira.
Em 1954 "Lugares-Comuns - Dicionário de Lugares-Comuns e Idéias Convencionais", como complemento à sua tradução do dicionário de Flaubert. Com "O Encontro Marcado" (1956), primeiro romance, abre à sua carreira um caminho novo dentro da literatura nacional.
Apesar de não ser militante político, Fernando Sabino viajou por todo o Brasil como auxiliar de Juarez Távora, candidato à presidência em 1955. Em 1963, foi nomeado redator do serviço público, em decorrência de colaboração regular que lhe encomendavam a Rádio Ministério da Educação e a Agência Nacional.. Morou em Londres de 1964 a 1966 e foi adido cultural da embaixada do Brasil em Londres, mantendo na BBC um programa semanal com a leitura de crônicas de sua autoria e tornou-se editor com Rubem Braga (Editora do Autor, 1960, e Editora Sabiá, 1967). Seguiram-se os livros de contos e crônicas "O Homem Nu" (1960), "A mulher do vizinho" (1962, prêmio Fernando Chinaglia do Pen Club do Brasil), "A Companheira de Viagem" (1965), "A Inglesa Deslumbrada" (1967), "Gente I e II" (1975), "Deixa o Alfredo Falar" (1976), "O Encontro das Águas" (1977), "A Falta que Ela Me Faz" (1980) e "O Gato Sou Eu" (1983). Com eles veio reafirmar as suas qualidades de prosador, capaz de explorar com fino senso de humor o lado pitoresco ou poético do dia-a-dia, colhendo de fatos cotidianos e personagens obscuros verdadeiras lições de vida, graças e beleza.
Viajou várias vezes ao exterior, visitando países da América, da Europa e do Extremo Oriente e escrevendo sobre sua experiência em crônicas e reportagens para jornais e revistas. Passa a dedicar-se também ao cinema, realizando em 1972, com David Neves, em Los Angeles, uma série de minidocumentários sobre Hollywood para TV Globo. Funda a Bem-te-vi Filmes e produz curtas-metragens sobre feiras internacionais em Assunção (1973), Teerã (1975), México (1976), Argel (1978) e Hannover (1980). Produz e dirige com David Neves e Mair Tavares uma série de documentários sobre escritores brasileiros contemporâneos.
Publicou ainda "O Menino no Espelho" (1982), romance das reminiscências de sua infância, "A Faca de Dois Gumes" (1985), uma trilogia de novelas de amor, intriga e mistério, "O Pintor que Pintou o Sete", história infantil baseada em quadros de Carlos Scliar, "O Tabuleiro de Damas" (1988), trajetória do menino ao homem feito, e "De Cabeça para Baixo" (1989), sobre "o desejo de partir e a alegria de voltar" - relato de suas andanças, vivências e tropelias pelo mundo afora.
Em 1990 lançou "A Volta por Cima", coletânea de crônicas e histórias curtas. Em 1991 a Editora Ática publicou uma edição de 500 mil exemplares de sua novela "O Bom Ladrão" (constante da trilogia "A Faca de Dois Gumes"), um recorde de tiragem em nosso país. No mesmo ano é lançado seu livro "Zélia, Uma Paixão". Em 1993 publicou "Aqui Estamos Todos Nus", uma trilogia de ação, fuga e suspense, da qual foram lançadas em separado pela Editora Ática, as novelas "Um Corpo de Mulher", "A Nudez da Verdade" e "Os Restos Mortais". Em 1994 foi editado pela Record "Com a Graça de Deus", leitura fiel do Evangelho, segundo o humor de Jesus. Em 1996 relançou, em edição revista e aumentada, "De Cabeça para Baixo", relato de suas viagens, "Gente", encontro do autor ao longo do tempo com os que vivem "na cadência da arte". Também em 96, a Editora Nova Aguilar Publicou em 3 volumes a sua "Obra Reunida". Em 1998 a Editora Ática lançou em separado a novela "O Homem Feito", do livro "A Vida Real", e "Amor de Capitu", recriação literária do romance "Dom Casmurro" de Machado de Assis. E ainda em 1998, além de "O Galo Músico", contos e novelas da juventude à maturidade, do desejo ao amor, a Record editou, com grande sucesso de crítica e de público, o livro de crônicas e histórias "No Fim dá Certo" - se não deu certo é porque não chegou ao fim. Também pela Record lança "A Chave do Enigma", onde diante do desafio da esfinge prefere ser devorado.
Em julho de 1999 recebeu da Academia Brasileira de Letras o maior prêmio literário do Brasil, "Machado de Assis", pelo conjunto de sua obra. O valor do prêmio, R$40.000,00, foi doado pelo autor a instituições destinadas a crianças carentes. O desembargador Alyrio Cavallieri, ex-juiz de menores, revelou que em 1992, todos os direitos recebidos pelo autor do polêmico livro "Zélia, uma paixão" também foram distribuídos a crianças pobres.

O BAILE




Levei um monte de tempo me vestindo. Não tinha roupa que servisse. Não gosto de festas, bailes menos ainda. A Morecy faz 13 anos. Eu não sei que roupa a gente tem que pôr quando a melhor amiga da gente faz 13 anos. Pra falar a verdade, preferia ter pego uma gripe e curtido febre na cama. Não pus o vestido verde porque fico com cara de defunto. O amarelo ficou dançando, acho que emagreci. Como sempre, acabei indo com o xadrezinho, que é meio manjado, mas me sinto bem.
Não consegui entrar em acordo com a minha cara no espelho. Não gosto do meu cabelo liso e muito fino. Nem da minha cara sem pó-de-arroz. Mas também de pó-de-arroz não fico bem.
Acho que levei umas duas horas me aprontando. Cheguei tarde, todo mundo já estava lá. Tinha luz negra, um montão de gente dançando e eu encabulei vendo o Luiz do outro lado do salão, conversando com os amigos.
Fiquei de pé também, falando com a Maria Luíza, aquela bem alta que todo mundo tira sempre para dançar porque é linda, parece a Dominique Sanda. Pegamos uns copos com guaraná e ficamos bebendo, enquanto ela me contava a briga que tinha tido com a D. Rita. Depois nós fomos dançar sozinhas mesmo. E na quarta música o Luiz veio falar comigo.
Foi daí que a gente saiu pro terraço e ele perguntou se eu gostava mesmo dele. Disse que sim. E é verdade, eu gosto um pouco dele. Então ele disse que se eu gostava mesmo era pra eu dar um beijo nele. Eu dei, no rosto. Ele disse que ali não valia, tinha que ser na boca. Ele falava e sorria, mas eu percebi que ele estava um pouco sem jeito, porque toda hora olhava pros lados, pra ver se não vinha ninguém.
Daí ele pegou na minha mão e depois me abraçou e ficou alando que gostava muito de mim, que eu tinha um cabelo bem macio, e eu pensei que poderia ser macio, mas era fino e liso demais. Daí ele disse que não gostava de menina que usava pintura, que ficava com cara de palhaço e que eu era bem natural. Foi bem essa a palavra que ele usou : natural. Achei engraçado falar assim, mas também achei legal ele falar desse jeito. Aí ele foi chegando, me beijando o cabelo, a testa, descendo pelo nariz e eu deixando porque vinha subindo em mim um calor gostoso, uma espécie de moleza que eu nunca tinha sentido antes...
(Mirna Pinsky. Iniciação. Belo Horizonte, Comunicação, 1980)


1) Quem é a principal personagem do texto ? Dê algumas de suas características.


2) Como essa personagem se sente em relação à festa ?


3) Qual é a auto-imagem da narradora do texto ? Justifique sua resposta.


4) Por que a narradora demora “umas duras horas”para se arrumar para a festa ?


5) Qual o sentimento que a narradora precisou vencer para ir ao baile ?


6) Qual foi o grande acontecimento na festa ?


7) Para a narradora, valeu a pena ir à festa ?


8) Que outro título você daria ao texto ?


9) Quais as qualidades que você espera encontrar em um namorado ou namorada ?



RESPOSTAS
1) É uma adolescente que não gosta de festas. Ela sente-se um pouco insegura e indecisa
2) Ela a vê como um problema. Resiste muito à idéia de ir pois não se sente bonita para a festa.
3) A auto-imagem da narradora é muito negativa, ela só vê seus defeitos e ignora suas qualidades.
4) Porque ela está insegura, não encontra a roupa ideal para a ocasião.
5) A narradora precisou vencer o medo, a insegurança.
6) Foi o beijo entre Luiz e a narradora.
7) Sim, pois ela conversou sobre seus sentimentos com Luiz, por quem nutria afeto.
8) Pessoal
9) Pessoal

Um breve conceito e termo epifânico




O termo português epifania deriva do grego epiphaneia que significa ‘aparição’; no Novo Testamento este termo está presente, o encontramos, por exemplo, nesta passagem:
". Graça que nos foi dada em Cristo Jesus antes dos tempos dos séculos, e que é manifesta agora pela aparição (epiphaneia) de nosso Salvador Jesus Cristo" (2 Tim. 1:9,10).
Referia-se à chegada de um rei ou de um imperador. Tinha também o significado de "grande passo" para a notoriedade.
Com significado religioso, refere-se às manifestações de Deus na história do homem. No Antigo Testamento, é expressa pelo termo "teofania". No Novo Testamento, é usado para indicar as manifestações de Jesus em sua humanidade-divindade durante Seu batismo, nas núpcias de Caná e, especificamente nesta solenidade, aos Magos: "...eis que uns magos chegaram do Oriente a Jerusalém perguntando: onde está o rei dos judeus? Vimos sua estrela no Oriente... A estrela que tinham visto no Oriente ia à frente deles até parar sobre o lugar onde estava o menino... E entrando na casa, viram o menino com Maria, sua mãe, e, caindo por terra, o adoraram..." (Mt 2,1ss).
James Joyce apropriou-se do conceito de epifania e secularizou-o, dando-lhe uma conotação essencialmente literária que, entretanto se institucionalizou no vocabulário crítico. A definição joyceana é largamente conhecida e frequentemente citada, embora surja apenas em Stephen Hero (edição e introdução de Theodore Spencer, Jonathan Cape, London, 1948), uma primeira versão de A Portrait of the Artist as a Young Man que é consensualmente considerada de inferior qualidade, foi rejeitada pelos editores, e o próprio autor não quis, posteriormente, que fosse publicada. Joyce apresenta o conceito nos seguintes termos: “Por epifania ele referia-se a uma súbita manifestação espiritual, presente quer na banalidade da fala ou do gesto quer num estado memorável da própria mente. Na sua opinião, cabia ao homem de letras registrar estas epifanias com um cuidado extremo, visto tratarem-se dos mais delicados e evanescentes dos momentos(…)” [itálicos nossos] (188) Stephen Hero, o protagonista do romance com o mesmo nome, glosa e adapta nesta passagem o terceiro elemento da definição de beleza de S. Tomás de Aquino – claritas. Como ele próprio explica, atribui a este termo um significado metafórico, interpretando-o como quidditas – que traduz por “radiance”. Os primeiros dois elementos – integritas e consonantia - são traduzidos na obra acima referida por “integrity” e “symmetry” (idem, p.189), enquanto no Portrait, os termos preferidos por Joyce são “wholeness” e “harmony”. De qualquer forma, os seus significados não diferem grandemente: no primeiro momento, o objecto destaca-se, definindo inequivocamente as suas fronteiras com o vazio momentâneo que constitui o não-objecto; em seguida, as partes que o constituem são analisadas, sendo percepcionada a simetria que o compõe; finalmente, como resultado de uma clara apreensão da forma do objecto, é operada uma síntese: “a sua alma, a sua materialidade ou essência [whatness] é projectada para fora das vestes da sua aparência, na nossa direcção” (idem,190). É este então o momento da epifania.
Na epifania, pelo contrário, é o objecto ele próprio que é revelado. Dito isto, importa reter alguns pontos essenciais da argumentação de Langbaum: primeiro, que o dito “psicologismo” ou subjectividade dos românticos - herdado em parte pelos modernistas - não se opõe necessariamente a um confronto com o real, sendo a epifania um dos pontos de encontro; em segundo lugar, este conceito é um dos marcos na transformação da prosa que ocorreu a partir de finais do século XIX, e sobretudo no primeiro quartel do séc. XX – a procura sistemática de formas de organização alternativas à linearidade do enredo. Neste processo, a poesia foi uma das fontes de “inspiração”, o que levou a que se fale do género “romance lírico”.
Os modernistas se relacionam com o conceito de epifania. As narrativas teriam de ser flexíveis o suficiente para apreender as óbvias e constantes metamorfoses do real, mas procuravam também pontos de referência que servissem de contraponto a essa fluidez (e que, em última análise, tornam os romances “legíveis” de alguma forma). Por outras palavras, a “democratização” de que se falou não implica um tecido narrativo indiferenciado. Mesmo uma prosa em muitos aspectos tão oposta à de Joyce como o é a de Virginia Woolf, com uma ênfase notório na fluidez dos pontos de vista, apresenta sistematicamente pausas que funcionam quase como chaves de leitura: “iluminações, fósforos que se acendem inesperadamente no escuro” (To the Lighthouse, p. 176). A epifania é um instrumento de revelação, que suspende o devir e se destaca dele. O momento, ainda que efémero, é registado - prende a atenção - e dessa forma prolonga o seu significado, permeia o resto do texto e fornece nós privilegiados de significado ao leitor.